sábado, 28 de novembro de 2009

Mais que vontade política


Nos últimos dias, o Brasil desempenhou um papel importante no debate das mudanças climáticas. Foram dois anúncios muito positivos, começando pelo índice de menor desmatamento na Amazônia nos últimos 21 anos. Em seguida, veio a divulgação de metas de redução de gases do efeito estufa entre 36,1% e 38,9% até 2020. Essa atitude puxou a responsabilidade das grandes economias emergentes a também se comprometerem, mesmo que voluntariamente, com números de diminuição de emissões, além de deixar os países desenvolvidos ainda mais pressionados a assumirem metas ambiciosas.


Até pouco tempo atrás, o Brasil era totalmente contrário a assumir qualquer compromisso tangível nesse sentido, alegando que apenas os países desenvolvidos tinham responsabilidade histórica com o problema do aquecimento global. Sendo assim, por mais que os números brasileiros sejam passíveis de dúvidas, pois o cálculo de redução foi feito em cima de uma previsão de emissões futuras, ao menos é uma sinalização política importante. E nesses momentos que antecedem à conferência da ONU para mudanças climáticas, a boa vontade política conta. E muito.


"O Brasil terá um papel chave em Copenhage, liderando as nações em desenvolvimento e pressionando os países desenvolvidos a assumirem seus compromissos", afirma Andrea Souza Santos, coordenadora de Mudanças Climáticas e Sustentabilidade do Ministério do Meio Ambiente.


Internamente, no entanto, sabemos que o país ainda tem passos muito importantes a dar para que consiga perpetuar essa curva de queda do desmatamento e cumprir suas metas de redução de emissões. O modelo econômico que vem sustentando o crescimento do Brasil é baseado na extração direta das suas riquezas naturais, seja soja, carne, minério de ferro, entre outros produtos de exportação. A cada três toneladas de carne vermelha consumida no mundo, uma vem do Brasil, e isso tem um grande impacto ambiental. Hoje, o principal vetor de desmatamento na Amazônia é justamente a pecuária.


“No momento em que a empresa financiada pelo governo investe na região amazônica e monta uma unidade com capacidade para abater milhares de animais por dia, está sinalizando para os produtores que eles podem desmatar e ampliar a produção, porque os animais serão comprados”, comenta André Muggiati, coordenador da campanha de pecuária do Greenpeace.

De acordo com Muggiati, os frigoríficos acusados de comprar boi de fazendas envolvidas no desmatamento da Amazônia receberam a maior parte dos US$ 2,65 bilhões investidos pelo BNDES em troca de ações para o governo federal, entre 2007 e 2009. Esses recursos foram distribuídos em cinco grandes empresas, responsáveis por 50% das exportações de carne e couro brasileiros.


O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) durante todo o ano de 2009 sofreu duras críticas do movimento social e de organizações ambientalistas por financiar projetos de alto impacto ambiental de grandes corporações. Indignados com a forma como o banco vem destinando seus recursos, os movimentos sociais criaram uma articulação de 30 organizações da sociedade civil para organizar o I Encontro Sul-Americano de Populações Afetadas pelos Projetos Financiados pelo BNDES. Segundo a Articulação, chamada Plataforma BNDES, apenas 10% dos recursos investidos pelo banco em 2008 foram direcionados para micro e pequenos empreendimentos.


"Assim como todo grande banco, o BNDES precisa pensar no aspecto da sustentabilidade dos projetos que financia", disse a coordenadora, ressaltando ainda que o papel de gestor do Fundo Amazônia aumenta ainda mais a responsabilidade do órgão em financiar projetos que estejam em dia com as questões socioambientais.


Para Paulo Moutinho, pesquisador do IPAM (Instituto de Pesquisas da Amazônia), o "crescimento econômico futuro vigoroso se dará em países que tomarem as decisões certas hoje: conservação de florestas (grandes armazéns de carbono), desenvolvimento tecnológico de energias limpas e renováveis e um destino mais nobre ao petróleo". As decisões em favor da conservação das florestas brasileiras, por exemplo, representa um tipo de poupança ou investimento de longo prazo, na visão de Moutinho.


"Parte significativa do crescimento futuro do PIB do Brasil poderá ser resultante da uma economia de baixo carbono que decidirmos implementar hoje. O país poderá ingressar na economia global de REDD (Reduções de Emissões de Desmatamento e Degradação Florestal), atualmente em debate na Convenção de Mudanças Climática da ONU. A sociedade brasileira tem tudo para dar um passo rumo a uma economia forte e com crescimento relevante do PIB, um PIB limpo", escreveu o pesquisador em seu blog, mencionando a criação do mecanismo de REDD, que prevê compensações financeiras para projetos de combate ao desmatamento, como um pagamento pelos serviços ambientais prestados pelas florestas. O Brasil é defensor da criação do REDD e terá o tema como um de seus focos em Copenhage.


Portanto, para que as metas anunciadas pelo Brasil sejam de fato cumpridas e façam mais do que mostrar vontade política em Copenhage, é preciso que o governo adote de forma consistente um modelo de desenvolvimento sustentável.


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